quarta-feira, 24 de julho de 2013

Suponha que um ímpio vá para o céu...

por J. C. Ryle

Por um momento, suponha que você, destituído de santidade, tivesse a permissão de entrar no céu. O que você faria ali? Que possíveis alegrias sentiria no céu? A qual de todos os santos você se achegaria e ao lado de quem se assentaria? O prazer deles não é o seu prazer; os gostos deles não são os seus; o caráter deles não é o seu caráter. Como você poderia sentir-se feliz ali, se não havia sido santo na terra?
Talvez agora você aprecie muito a companhia dos levianos e descuidados, dos homens de mentalidade mundana, dos avarentos, dos devassos, dos que buscam prazeres, dos ímpios e dos profanos. Nenhum deles estará no céu.
Provavelmente, você ache que os santos de Deus são muito restritos, sérios e individualistas; e prefere evitá-los. Você não encontra nenhum prazer na companhia deles. Mas não haverá no céu qualquer outra companhia.
Talvez você ache que orar, ler a Bíblia e cantar hinos são realizações monótonas e estúpidas, coisas que devem ser toleradas aqui e agora, mas não desfrutadas. Você reputa o dia de descanso como um fardo, uma fadiga; provavelmente, você não gasta mais do que um pequeníssima parte deste dia na adoração a Deus. Lembre-se, porém, de que o céu é um dia de descanso interminável. Os habitantes do céu não descansam, noite e dia, clamando: “Santo, santo, santo é o Senhor, Deus todo- poderoso” e cantam todo o tempo louvores ao Cordeiro. Como poderia um ímpio encontrar prazer em uma ocupação como esta?
Você acha que um ímpio sentiria deleite em encontrar-se com Davi, Paulo e João, depois de ter gasto a sua vida na prática daquelas coisas que eles condenaram? O ímpio pediria bons conselhos a estes homens e acharia que tem muitas coisas em comum com eles? Acima de tudo, você acha que um ímpio se regozijaria em ver Jesus, o Crucificado, face a face, depois de viver preso nos pecados pelos quais Ele morreu, depois de amar os inimigos de Jesus e desprezar os seus amigos? Um ímpio permaneceria confiantemente diante de Jesus e se uniria ao clamor: “Este é o nosso Deus, em quem esperávamos… na sua salvação exultaremos e nos alegraremos” (Is 25.9)? Ao invés disso, você não acha que a língua de um ímpio se prenderia ao céu de sua boca, sentindo vergonha, e que seu único desejo seria o ser expulso dali? Ele haveria de sentir-se estranho em um lugar que ele não conhecia, seria uma ovelha negra entre o rebanho santo de Jesus. A voz dos querubins e dos serafins, o canto dos anjos e dos arcanjos e a voz de todos os habitantes do céu seria uma linguagem que o ímpio não entenderia. O próprio ar do céu seria um ar que o ímpio não poderia respirar.
Eu não sei o que os outros pensam, mas parece claro, para mim, que o céu seria um lugar miserável para um homem destituído de santidade. Não pode ser de outra maneira. As pessoas podem dizer, de maneira incerta, que “esperam ir para o céu”, mas elas não meditam no que realmente estão dizendo. Temos de ser pessoas que possuem uma mentalidade celestial e têm gostos celestiais, na vida presente; pois, do contrário, jamais nos encontraremos no céu, na vida por vir.
Agora, antes de prosseguir, permita-me falar-lhe algumas palavras de aplicação. Pergunto a cada pessoa que está lendo este artigo: você já é uma pessoa santa? Eu lhe suplico que preste atenção a esta pergunta. Você sabe alguma coisa a respeito da santidade sobre a qual lhe estou falando? Não estou perguntando se você costuma ir regularmente a uma igreja, ou se você já foi batizado, ou se você recebe a Ceia do Senhor, ou se tem o nome de cristão. Estou perguntando algo muito mais significativo do que tudo isso: “Você é santo ou não?”
Não estou perguntando se você aprova a santidade nos outros, se você gosta de ler sobre a vida de
pessoas santas, de conversar sobre coisas santas, de ter livros santos em sua mesa, se você sabe o que significa ser santo ou se espera ser santo algum dia. Estou perguntando algo mais elevado: “Você mesmo é um santo ou não?”

E por que eu lhe pergunto com tanta seriedade, insistindo com tanto vigor? Faço isto porque a Bíblia diz: “Segui… a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor”. Está escrito, não é minha imaginação; está escrito, não é minha opinião pessoal; é a Palavra de Deus, e não a do homem: “Segui… a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14).
Que palavras perscrutadoras e separadoras são estas! Que pensamentos surgem em meu coração, enquanto as escrevo! Olho para o mundo e vejo a maior parte das pessoas vivendo na impiedade. Olho para os cristãos professos e percebo que a maioria deles não têm nada do cristianismo, exceto o nome. Volto-me para a Bíblia e ouço o Espírito Santo: “Segui… a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14).
Com certeza, este é um versículo que tem de fazer-nos considerar nossos próprios caminhos e sondar nossos corações; tem de suscitar em nosso íntimo pensamentos solenes e levar-nos à oração.
Você pode menosprezar estas minhas palavras, dizendo que tem muitos sentimentos e pensamentos sobre estas coisas, mais do que muitos podem imaginar. Entretanto, eu lhe respondo: “Isto não é mais importante. As pobres almas no inferno fazem muito mais do que isto. O mais importante não é o que você sente e pensa, e sim o que você faz”.
Você pode argumentar: “Deus nunca tencionou que todos os cristãos fossem santos e que a santidade, conforme a descrevemos, é apenas para os grandes santos e para pessoas de dons incomuns”. Eu respondo: “Não posso encontrar este argumento nas Escrituras; e leio que ‘a si mesmo se purifica todo o que nele [em Cristo] tem esta esperança’” (1 Jo 3.3). “Segui… a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor” (Hb 12.14).
Você pode argumentar que é impossível ser santo e, ao mesmo tempo, cumprir todos os nossos deveres nesta vida: “Isto não pode ser feito”. Eu respondo: “Você está enganado”. Isto pode ser feito. Tendo Cristo ao nosso lado, nada é impossível.
Outros já fizeram isto. Davi, Obadias, Daniel e os servos da casa de Nero, todos estes são exemplos que comprovam isto.

Você pode argumentar: “Se nos tornássemos santos, seríamos diferentes das outras pessoas”. Eu res- pondo: “Sei muito bem disso. Mas é exatamente isso que você deve ser. Os verdadeiros servos de Cristo sempre foram diferentes do mundo que os cercava — uma nação santa, um povo peculiar. E você tem de ser assim, se deseja ser salvo!”
Você pode argumentar que a este custo poucos serão salvos. Eu respondo: “Eu sei disso. É exatamente sobre isso que nos fala o Sermão do Monte. O Senhor Jesus disse, há muitos séculos atrás: “Estreita é a porta, e apertado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela” (Mt 7.14). Poucos serão salvos, porque poucos se dedicarão ao trabalho de buscar a salvação. Os homens não renunciarão aos prazeres do pecado, nem aos seus próprios caminhos, por um momento sequer.
Você pode argumentar que estas são palavras severas demais; o caminho é muito estreito. Eu respondo: “Eu sei disso; o Sermão do Monte o disse”. O Senhor Jesus o afirmou há muitos séculos atrás. Ele sempre disse que os homens tinham de tomar a sua cruz diariamente e mostrarem-se dispostos a cortarem suas mãos e seus pés, se quisessem ser discípulos dEle. No cristianismo acontece o mesmo que ocorre em outros aspectos da vida: sem perdas, não há ganhos. Aquilo que não nos custa nada também não vale nada.

Ryle serviu por quase 40 anos como ministro do Evangelho. Foi um escritor prolífico, um pregador vigoroso e um pastor fiel. Muitas de suas obras têm sido reeditadas e servido como fonte de instrução e consolo para o povo de Deus. A Editora Fiel publicou algumas de suas obras em português: o clássico “Santidade”; “Uma palavra aos moços”; “Fé genuína” e os quatro volumes de meditações nos evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João.

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